Especialista da Universidade Nova de Lisboa comenta assunto em programa da UNIVESP TV
É possível produzir pautas e matérias jornalísticas a partir do envolvimento de crianças? Buscando respostas para este questionamento, a pesquisadora e jornalista Juliana Doretto, da Universidade Nova de Lisboa, desenvolveu a sua tese “Fala connosco”: o jornalismo infantil e a participação das crianças, em Portugal e no Brasil.
A pesquisa se concentra na participação das crianças no jornalismo feito para o universo infantil. Essa participação, segundo a jornalista, pode ser considerada como toda forma de contato que esse público possui com os veículos produzidos para ele. A análise foi baseada nas cartas e e-mails enviados pelo pequeninos para as revistas Visão Junior (portuguesa) e Ciência Hoje das crianças (brasileira).
Olhar crítico
Doretto entrevistou profissionais que fazem periodismo infantil – área que, segundo ela, ainda sofre preconceito no meio jornalístico, o que implica em salários achatados. “Os pares jornalistas tendem a pensar no jornalismo para crianças como algo menor, no sentido de ser mais fácil, de ser bobo, ingênuo – é uma coisinha que se escreve para criança -, qualquer um faz”, discorreu.
“O que eu observei, principalmente na revista brasileira, é que […] as crianças pedem aquilo que elas veem e gostam, e o jornalista precisa oferecer algo que as crianças nem sabem que gostam”, analisou.
A pesquisadora também ouviu 51 crianças de 9 a 16 anos, de classes média e média-alta, no Brasil e em Portugal, por meio de entrevistas em grupos de foco. De acordo com a pesquisadora, escutar o que os jovens tinham a dizer foi o momento mais interessante do trabalho. “A parte em que eu me diverti mais. Não é difícil ouvir as crianças, muito pelo contrário, o difícil é saber como ouvi-las e como falar com elas”, afirmou.
De acordo com Doretto, as crianças olham para o jornalismo de um modo geral com perspicácia: criticam o jornalismo adulto pelo excesso de informações, pela repetição constante de notícias e pelo sensacionalismo. Os pequenos também reclamam da violência, do excesso de notícias negativas e do jornalismo infanto-juvenil. “As crianças não vivem num mundo à parte, elas vivem no mesmo mundo que os adultos. […] Há uma série de temas relacionados às crianças, mas o [universo] delas é o mesmo nosso. Elas conseguem entender muito bem quando o jornalismo falha”, afirmou.
Noticiário com linguagem de criança
Ao estudar em Portugal, Doretto percebeu diferenças nas referências culturais entre as amostras de crianças dos dois países, o que teria como principal elemento diferenciador a desigualdade social. De acordo com a jornalista, apesar de Portugal ser considerado um dos países pobres da Comunidade Europeia, a questão da edução está mais bem resolvida do que no Brasil.
Segundo a jornalista, ainda faltam conteúdos jornalísticos voltados para o público infantil brasileiro, sejam impressos, na televisão ou internet. “A TV ainda é um veículo extremante importante para as crianças menores, por que elas têm um acesso mais controlado às novas tecnologias”, analisa.
Doretto afirma que, se houvesse investimento, seria possível traduzir o noticiário adulto para a linguagem da criança, auxiliando-as a entender assuntos atuais que dizem respeito à sociedade. “A presença de um telejornal para crianças, especialmente na TV pública brasileira, com uma programação mais qualificada, educativa, e que não seja tão ligada às audiências, é uma lacuna bastante grande no Brasil”.
Confira a entrevista completa:
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