11/03/04


Foi durante o ensino médio que o biofísico alemão Erwin Neher, hoje com 69 anos, ficou fascinado com a ideia de que pelas células do corpo humano percorriam correntes elétricas. O desejo de compreender melhor esse fenômeno o direcionou para a carreira científica.

Graduou-se em Física no início dos anos 1960 pela Universidade Técnica de Munique (Technische Universität München), na Alemanha. Fez o mestrado em biofísica pela University of Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, e, de volta a Munique, começou a estudar a transmissão de impulsos nervosos em células de caracóis durante o seu doutorado.

O trabalho o levou ao Max Planck Institute of Psychiatry, onde na época estavam sendo investigados mecanismos sinápticos em neurônios de moluscos. Nesse período, conheceu o fisiologista Bert Sakmann, que se tornou um amigo e parceiro no desenvolvimento de um método revolucionário capaz de medir corrente elétrica em células, conhecido como patch-clamp.

Em linhas gerais, a técnica consiste em isolar um pedaço da membrana celular com uma micropipeta de vidro com um eletrodo em seu interior. A corrente que flui pela micropipeta é a mesma da membrana celular e, aplicando uma tensão conhecida, torna-se possível fazer a medição.

Neher e Sakmann conseguiram, dessa forma, provar algo debatido na ciência havia muito tempo: a existência dos canais iônicos – proteínas presentes na membrana celular que funcionam como túneis ligando o interior e o exterior da célula e permitindo a passagem de íons, como potássio, sódio e cálcio, por meio dos quais passa a corrente elétrica.

Os pesquisadores isolaram, pela primeira vez, um minúsculo canal iônico e decifraram assim a comunicação celular. Os primeiros resultados foram publicados em 1976, em um artigo na revista Nature. Após alguns anos de aperfeiçoamento, a técnica se tornou sensível o suficiente para registrar até as mais discretas alterações na corrente elétrica, o que possibilitou realizar pesquisas de eletrofisiologia com células de mamíferos.

patch-clamp - que nunca chegou a ser patenteado – é usado até hoje em laboratórios de todo o mundo. Contribuiu para o entendimento de diversas doenças relacionadas ao mau funcionamento de canais iônicos, como fibrose cística, fibromialgia e um tipo de arritmia hereditária conhecido como síndrome de Brugada.

O método também abriu caminho para o tratamento de certos tipos de dores crônicas e da diabetes neonatal e ajudou a tornar os testes de novos medicamentos mais seguros.

Ao longo de sua carreira, Neher ganhou diversos prêmios – entre eles o Leibniz Award, em 1986, considerado o mais importante na área da ciência na Alemanha. O reconhecimento internacional veio em 1991, quando ele e Sakmann foram contemplados com o Nobel de Medicina.

Nessa época, Neher já havia abandonado os estudos sobre canais iônicos e vinha se dedicando ao tema que hoje o fascina: entender como ocorre a liberação de neurotransmissores e transmissão sináptica. Em sua avaliação, tal conhecimento é fundamental para compreender diversas doenças neurológicas e abrir caminho para uma possível cura.

Atualmente, Neher é pesquisador do Max Planck Institute for Biophysical Chemistry, em Göttingen, na Alemanha, onde coordena um grupo de pesquisa sobre biofísica de membrana.

De passagem por São Paulo – onde proferiu, nos dias 29 e 30 de janeiro, palestras durante a programação da exposição científica Túnel da Ciência Max Planck -, Neher concedeu uma entrevista à Agência FAPESP, na qual falou sobre as pesquisas do passado, do presente, sobre a importância da comunicação científica e sobre o que chama de “estilo de vida da ciência”. 

Veja a entrevista com Erwin Neher na íntegra aqui.